22 fevereiro 2010

4ª Sinfonia de Anton Bruckner

Escultei a quarta pela primeira vez alguns dias antes dela ser tocado pela Orquestra Sinfonica de Santo André; pois algo que notei, em minha curta experiência é que é péssimo ouvir a primeira vez uma sinfonia (salvo raros casos); você fica literalmente perdido, quanto mais Bruckner, é como chegar num mundo novo, de vegetação e relevo totalmente intrigantes e extraordinários; você tem que dar tempo para os seus sentidos se adaptarem e então, realmente poder contemplar o lugar.

Eu fui com certo receio de ouvi-la, achei maravilhosa a quarta. Porém, da última vez que ouvi Bruckner ao vivo, (a sétima sinfonia), no terceiro movimento já estava com dor de cabeça com os berros dos metais que inventaram um FFFFFFFF! E ai já pensei, lá vai eu sair com dor de cabeça de novo. Para a minha felicidade não foi o que ocorreu, mas foi muito lindo, belo. Num certo momento uma mulher atrás de mim deixou escapar as palavras "que bonito"; e outros amigos também comentaram que gostaram muito - até o rockeiro. Contudo, eu achei que as trompas principalmente deixou a desejar. E no todo, faltou uma inspiração nos instrumentistas, pois tinha hora que deixavam a música morrer.

Até que então encontrei essas duas interpretação no site PQP Bach, e eu fiquei simplesmente encantado pela de Bernard Haitink a sonoridade, parecia um solo extremamente inspirado de cada instrumentistas, os metais então... que te prende a concentração em cada detalhe do inicio ao fim. E confeço que se tornou uma de minhas sinfonias favoritas. Talvez a mais favorita seja a nona de Beethoven, porem o quarto mov. sempre deixou a desejar no que ouvi (talvez, falte ouvir em português, ou aprender alemão, para as palavras também fazerem sentido), e amo o mov. 1 e 2 sob a batuta de Toscanini; mas de cabo a rabo, acho que essa 4ª de Bruckner tornou minha favorita. De tal modo, que passei a me exercitar no trompete tocando o quarto movimento.

É notável se compararmos com a terceira, que era uma homenagem a Richard Wagner, é muito diferente, até parece outro compositor (ainda mais que Bruckner tem estilo próprio inconfundivel) parece que ele deixou um pouco Wagner de lado e buscou algo mais voltado para Bach e Brahms. Alguns insistem em classificá-la como romantica, talvez pela intensidade e encanto de certas expressões. Porém, ao meu ver ela é muito mais religiosa e poética do que meramente romantica; diria de certo modo, ser extremamente religiosa; porém, totalmente diferente da religiosidade que vemos na sétima sinfonia, por exemplo. Especialmente o quarto movimento que parece até uma feliz e grata oração.

É uma obra incrivel, tem que se ouvir num bom volume e com um som que tenha um bom grave para não perder os detalhes e impactos das harmonias que nos lembra obras com órgão ou cravo de Bach. Porém, não num volume de modo a deixá-la gritante e estérica ou de fazer doer os ouvidos. Tem que manter o nivel do sereno. E se possível, relaxar, fechar os olhos e concentrar-se totalmente na música, sem pressa, sem preocupações, sem mais nada na cabeça. É uma daquelas experiências que transforma e muda o dia.

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Royal Concertgebouw Orchestra (1965)
Reg.: Bernard Haitink
Duração:  54 min.
Movimentos:
I Bewegt, Nicht Zu Schnel 18:25
II Andante, Quasi Allegrettony 15:54
III Scherzo. Bewegt - Trio. Nicht 9:51
IV Finale. Bewegt, Doch Nicht Zu 19:49

21 fevereiro 2010

Grupo Instrumental IASD Central Santo André

Doxologia:



Trecho final do hino "Dai-nos Luz"

11 fevereiro 2010

Considerações Sobre Bruckner

Anton Bruckner ganha celebração incógnita

Um ancião de aparência insignificante passa a manhã de domingo de 11 de outubro de 1896 às voltas com papéis. Venta muito em Viena. Ele se sente mal e se deita. Sua governanta, Kathi, lhe traz uma xícara de chá. Sorve o líquido com satisfação e pede mais um pouco. Kathi vai buscar o chá na cozinha. Quando volta, encontra o velho com a cabeça pendida para o lado. Assim morreu Anton Bruckner, aos 72 anos de idade, de pneumonia. Aquela manhã ele havia consumido ao piano a fim de retocar o “Finale” de sua “Nona Sinfonia, em Ré Menor”. Não completou o trabalho. As comemorações do centenário do acontecimento calham à banalidade que caracterizou sua vida. Talvez a monumentalidade de sua escritura nada tenha a ver com um mero século.

O centenário passa quase incógnito para um dos grandes mestres da sinfonia. Foi lembrado somente em Linz, onde trabalhou boa parte de sua vida como mestre-de-capela e organista da catedral da cidade. Realizou-se há um mês o Festival Bruckner, com execuções das dez sinfonias (há uma sinfonia “0”, desprezada pelo compositor) e algumas de suas sete missas, além do”Quarteto de Cordas em Fá Maior”, uma das raras peças de câmara que criou. O regente francês Pierre Boulez fez pela primeira vez uma obra do compositor. Regeu a “Sétima”, à frente da Orquestra Filarmônica de Viena. “Nós, franceses, nos acostumamos a desprezar Bruckner”, diz Boulez. “É uma obra que integra o patrimônio orquestral germânico”. As flutuações agógicas de Bruckner pouco têm a ver com a síntese bouleziana, herdada de outro Anton, Webern. O ritmo e os andamentos nas sinfonias brucknerianas se movem por ondas de indeterminação, prolongando-se ao infinito. A “Oitava, em Dó Menor”, por exemplo, dura quase 90 minutos. O dobro deste tempo é o que leva para ser executada a obra completa de Webern.

Bruckner se presta a esse tipo de paradoxo. Começou a compor aos 41 anos, idade em que Mozart, Schubert ou Pergolesi não alcançaram nem de longe. Ignorante e carola, pouco evoluiu em relação à mentalidade de sua aldeia natal, Ansfelden, na Alta-Áustria. Quase sem sair dela, amplificou a orquestra e alongou a forma sinfônica a escalas sobre-humanas, preparando o terreno para as alucinações apocalípticas de Gustav Mahler. Introduziu a técnica do leitmotiv e a instrumentação de Richard Wagner na sinfonia. Um dos traços de suas sinfonias é a utilização enfática da tuba wagneriana, maior e mais potente do que a normal. Assinou as passagens mais longas e vagarosas da história da música. Pretendeu, desse modo, inserir a melodia infinita wagneriana nas grandes formas do discurso sinfônico. Sua música envereda pela dízima periódica dos andamentos. Há adágios, como o da “Sinfonia número 7, em Mi Maior”, que parecem fermatas instaladas na música para indicar a eternidade.

O católico praticante forjou harmonias tão ousadas para a época, que alunos e editores trataram de revisar as partituras. Bruckner aceitou as alterações e se encarregam de algumas delas no fim da vida. Daí até hoje existirem controvérsias quanto à execução. Elas se expressam nas duas grandes edições de obras completas de Bruckner existentes: a “Gesamtausgabe” (Edição Completa), organizada por L. Nowak, contém versões “corrigidas” e com cortes; a “Sämtliche Werke” (Obras Completas), organizada por R. Haas, afirma seguir fielmente os manuscritos. Quem quiser apreciar a produção de Bruckner em sua inteireza deve prestar atenção a tais detalhes. Há gravações no mercado baseadas nas duas versões. Hoje em dia, porém, os maestros pesquisam nos originais para executar as obras, mencionando sempre o fato nos programas de concerto e livretos de CDs. Bruckner demorou muito para ser executado. Ganhou estima de público depois da Primeira Guerra, por iniciativa dos maestros wagnerianos Bruno Walter (1876-1962) e Hans Knappertsbusch (1888-1965) e Wilhelm Furtwängler (1886-1954). Este, aliás, quis seguir a carreira de compositor como herdeiro direto do mestre de Linz.

Literalmente Bruckner beijou os pés de Wagner, mas guardou para si o pior dos orgulhos, o dos que se vêem como gênios e agem com obstinação imbatível. Num dos acessos de megalomania que lhe nasciam da vida medíocre, Bruckner escreveu a um amigo: “Aconteceu comigo o que aconteceu a Beethoven; ele também não foi entendido pelos imbecis”.

Sua formação como compositor foi autodidata. Aprendeu órgão com o pai, músico amador e mestre-escola. No início da vida adulta, Bruckner ensinou em escolas de vilarejos, até ser admitido como aluno e mais tarde organista da abadia de St. Florian. Ali tomou contato com a música de Palestrina, Antonio Caldara, Johann Sebastian Bach, Haydn e Mozart. Nos dois últimos baseou-se para escrever suas primeiras obras, “Requiem em em Ré Bemol” e a. “Missa Solemnins em Si Bemol”. Até então escrevia como um atrasado da província. Em 1863, porém, fez-se a luz. O organista assistiu à première da ópera “Tannhäuser”, de Wagner, em Linz, em fevereiro de 1863. Dois anos depois assistiu à estréia de “Tristão e Isolda” em Munique. Conheceu Wagner pessoalmente e se assumiu como wagnerista.

Em 1868 mudou-se para Viena para trabalhar como professer de harmonia, contraponto e órgão no Conservatório. De 1871 até a morte, dedicou-se a escrever sinfonias. Teve poucos amores, não se casou. Para conquistar uma mulher, oferecia-lhe missais. Não teve sucesso com nenhuma. Em 1873 visitou Bayreuth, ainda em construção. Os cronistas da época o retratam em caricatura como um bajulador, sempre pronto a se auto-humilhar. Ao fim dos concertos, entregava moedas de ouro ao maestro que se saía bem em suas sinfonias. Em Bayreuth, sobraçava uma casaca, para vesti-la toda vez que topasse com Wagner. Então se inclinava e fazia rapapés. Havia enviado ao guru a partitura de sua “Terceira Sinfonia, em Ré Menor”, a ele dedicada, e queria ouvir-lhe a opinião. A mulher de Wagner, Cosima, queria impedir o encontro. Mas Wagner finalmente o recebeu na mansão de Wahnfried. “Sua sinfonia é uma obra-prima”, disse, segundo contou depois Bruckner. “Estou muito honrado de aceitar a dedicatória”. Bruckner, segundo ele próprio, não pôde conter as lágrimas.

Wagner passou a lutar pela execução das obras de Bruckner. Seu papado, entretanto, não compreendia Viena. Ali ditava as normas do gosto o inimigo número um do pontífice de Bayreuth, o crítico Eduard Hanslick (1825-1904). Formalista, Hanslick refutava a música do futuro wagneriana por considerá-la excessivamente expressiva. Defendia a música de Brahms e considerava Bruckner o representante de Wagner em Viena. “A expressão dos sentimentos não constitui o conteúdo da música”, escreveu oi crítico. Ora, era tudo o que não pensava Wagner e, por extensão natural, Bruckner. Por influência de Hanslick, a Filarmônica de Viena recusou-se a executar uma a uma sinfonia que Bruckner lhe apresentava. A primeira chamaram de “desvairada” e assim por diante. As apresentações dessas partituras colecionaram desastres.
Wagner morreu em 1883 e Bruckner parecia despontar para o anonimato aos 60 anos de idade. Envolvido pelo luto, escreveu a “Sétima Sinfonia”. O maestro Arthur Nikish (1855-1922), antigo violinista da Filarmônica de Viena, decidiu executá-la no Teatro Municipal de Leipzig, do qual era diretor artístico. A estréia, em 30 de dezembro de 1884, colocou Bruckner no mapa musical. Aos 60 anos, foi comparado a Beethoven e Liszt. A “Sétima” sintetizava as linguagens de Beethoven e Wagner e é a obra mais conhecida do compositor.. Até então, a forma-sonata em sinfonia compreendia duas áreas tonais. Bruckner adotou uma terceira. Os desenvolvimento dos temas da obra são tempestuosos e erram por modulações estranhas. As melodias cromáticas dão saltos de sétima, quinta e sexta. Nascem do silêncio para aos poucos se elevarem em “tutti” desenhados monumentalmente por cordas, oito trompas, três trompetes, três trombones e cinco tubas. A “Sétima” foi a única fatia de glória que recebeu em vida.

As obras orquestrais de Bruckner formam estruturas achatadas, interrompidas vez por outro por terremotos de semicolcheias, tocados por metais e hachurados por cordas agitadas. À maneira de Mahler, Bruckner compôs os mundos excêntricos onde quis viver. Habitou sinfonias que lembram planícies pedregosas e vincadas de precipícios. Dedicou a úiltima sinfonia “ad majorem Dei gloriam” (para a maior glória de Deus) e autografou o tema final do Adagio (”muito lento e solene”) com a expressão “Abschied vom Leben” (Adeus à Vida). As tubas realizam um coral cromático sustentada pelos violinos. Tudo soa coerente.

A obra do mestre-escola de Linz deve ser compreendida pela grandiloqüência dos saltos abruptos de intervalos, harmonias e dinâmicas. É um planeta único, para muitos irrespirável, mas sem o qual não é possível entende a tradição sinfônica vienense que começa em Haydn, progride por Beethoven e Schubert e se encerra nas hipérboles de Mahler. O humilde Bruckner produz a culminância do gênero. Com ele, a sinfonia refuta a voz humana e o programa extramusical, como a virar pelo avesso a “obra de arte total” (Gesamtkunstwerk”) de Wagner. Torna-se conceito indefinido. Tinha razão. Os imbecis vão continuar sem entendê-lo.
Luís Antônio Giron

05 fevereiro 2010

Teses da USP sobre Música

Bem vai ai algumas teses interessantes:

Ouvir a voz: a percepção da produção vocal pelo Regente Coral - método e formação
http://www.teses.usp.br/documentos.php?doc=3

"Parâmetros acústicos subjetivos: critérios para avaliação da qualidade acústica de salas de música" [esse todo sonoplatista e diretor de música, e quando for pensar em fazer reforma ou construir uma igreja, deveriam ler.]
http://www.teses.usp.br/documentos.php?doc=3

A produção musical evangélica no Brasil
http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8138/tde-04062008-152940/

O sentido na música: semiotização de estruturas paradigmáticas e sintagmáticas na geração de sentido musical
http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8139/tde-06032007-190915/

Música na escola: desafios e perspectivas na formação contínua de educadores da rede pública
http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48134/tde-08122009-152940/

Os direitos autorais no mercado da música
http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2131/tde-28092009-082901/

Melodia e prosódia: um modelo para a interface música-fala com base no estudo comparado do aparelho fonador e dos instrumentos musicais reais e virtuais
http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8139/tde-12112007-141109/

Sobre Samba e a Industria da Cultura Brasileira
http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8137/tde-28052003-160547/

A percepção emocional da musica
http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/59/59137/tde-08102008-013413/

O sentido na música
http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8139/tde-06032007-190915/

O som e o soberano: uma história da depressão musical carioca pós-Abdicação (1831-1843) e de seus antecedentes
http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8138/tde-16072007-110842/

Percepção musical como compreensão da obra musical: contribuições a partir da perspectiva histórico-cultural
http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48134/tde-09092009-162831/

Ascendência retórica das formas musicais
http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/27/27140/tde-23072009-204002/

A voz contemporânea
http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/27/27158/tde-07052009-124351/